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Já é sabido o quão desafiador é o processo de empreender aqui no Brasil. Seja pela economia, pela burocracia ou por diversos outros fatores, investir na abertura de um negócio exige, acima de tudo, coragem e um pouquinho de loucura. Estudo e experiência profissional também ajudam, é claro. Depois de embarcar na empreitada, a experiência, talvez seja um dos quesitos mais importantes para garantir a sobrevivência de um negócio. A experiência, entendo que possa vir de atividades na iniciativa privada mas também através outros empreendimentos passados – sendo com sucesso e, principalmente, com o fracasso. Na maioria das vezes, o fracasso nos faz mais preparados para o próximo desafio.

Hoje, meu objetivo é justamente falar da transição da carreira executiva para ser um empreendedor. Logo de cara, já pude constatar que que todo o conhecimento absorvido na carreira corporativa irá somar quando você decidir se tornar um empreendedor, principalmente se a área em que estiver empreendendo tiver relação com sua experiência executiva. É importante realizar este processo de transição sem perder o olhar estratégico. Tomar a decisão de arriscar, abandonando um cargo de destaque que já exerce, significa um ponto de partida para o novo caminho como empreendedor.




Após cursar o ensino técnico, logo no primeiro período, ingressei na empresa júnior da faculdade de Economia. Após dois anos, no início de 2002, fui encarar um novo desafio, entrei em uma importante rede varejista do Rio de Janeiro. No primeiro momento, era estagiário da área de tecnologia onde desenvolvi o projeto para gerar aumento de produtividade nas reuniões. Após três meses nessa posição, fui convidado para integrar o time comercial como analista de compras. Toda essa experiência do início da carreira me fortaleceu profissionalmente.

No final de 2013, ingressei na área que realmente tinha mais aptidão: passei no processo de trainee de uma firma com sede em Londres, especializada na prestação de serviços de auditoria, elisão fiscal, consultoria e transações corporativas, para exercer a função de auditor externo. Dois anos depois, ingressei em uma empresa brasileira de papel e celulose como analista de planejamento financeiro, atuando no braço petroquímico do grupo. Quando saí de lá, recebi propostas de diversas empresas, quase todas muito bem estruturadas e tradicionais. Contrariando as opções tradicionais, optei por um projeto incrível para ganhar menos e sem função específica.

O empreendedorismo é um desafio apaixonante, exige que você enxergue além. Você precisa ver além. Naquele momento, receberia menos, porém, comecei a vislumbrar como seria trabalhar em um projeto desde o início. Ingressar em uma empresa que atua no mercado de produção e comercialização de biocombustíveis, especialmente bioetanol, era um projeto ambicioso. Construímos a empresa do zero. Durante esse período, o aprendizado foi imensurável, aprendi coisas neste lugar que nunca irei esquecer.




Essas experiências me permitiram me tornar CFO de duas empresas investidas, onde fiquei por seis anos. Enquanto exercia o cargo de CFO em uma firma de Agregados Minerais e Materiais para a Construção Civil, decidi empreender e investir em meu próprio negócio. Montei com mais dois sócios uma butique de M&A. Lá, ajudávamos empresas a levantarem capital.

Por incrível que possa parecer, essa não foi a decisão mais difícil da minha vida profissional. A ideia de empreender já estava tomada há anos e tinha chegado a hora, bem no meio da maior crise econômica da história do Brasil – lembram que falei da dose de loucura? Tinha outros loucos que embarcaram essa empreitada.

Criamos a empresa já com investidores “garantidos” – que desistiram de investir praticamente na hora de assinar o contrato. Isso é pouco para frear um empreendedor. Colocamos nosso dinheiro, recusamos algumas ofertas de emprego com bons salários, afinal já tínhamos um compromisso firmado entre nós.

Sempre me considerei um funcionário e executivo “empreendedor”, tinha visão de dono. Sempre cuidei das empresas em que trabalhava com paixão de dono. Nesse período, aprendi a maior lição da minha vida profissional: trate tudo o que você faz com carinho e capricho. Por coincidência (ou não) ouvia isso constantemente de dois líderes italianos brilhantes que tive o prazer de trabalhar.




Tínhamos como lema não ser apenas um broker, mas oferecer um trabalho consultivo para ajudar as empresas a se organizarem do ponto de vista contábil e antecipar problemas de uma eventual due-diligence. Durante nossa prestação de serviço, acabamos desenvolvendo um produto – o que viria a ser a empresa que trabalho atualmente. Eu imputo o crédito do desenvolvimento deste produto, além do brilhantismo do meu sócio, o João Mano, ao fato de termos tratado todos os nossos clientes com carinho e capricho.

Quando concebemos nosso atual negócio, imaginávamos que atenderíamos as pequenas empresas e, com o tempo, percebemos que o atendimento a grandes empresas também seria um foco essencial. Aos poucos deixamos a atividade de consultoria e passamos a focar exclusivamente na nossa empresa. Todos os anos em que atuei em cargos de gestão me ajudaram a iniciar o meu próprio negócio e me deram mais segurança. Sigo aprendendo diariamente com os desafios de se empreender em nosso país, sem perder a confiança e o otimismo. Investir em novos conhecimentos e partilhar minha experiência com outros profissionais é o que me ajuda a crescer como pessoa e como empreendedor.

Empreender realmente não é fácil, ainda mais para quem tinha uma vida confortável como executivo. Esse detalhe faz com que a decisão de empreender seja da família e não apenas sua. As dificuldades e, principalmente, as abdicações materiais que virão precisam ser compartilhadas com a mesma paixão pelo(a) companheiro(a). No meu caso, tive total suporte da minha esposa. Sempre uma grande parceira, apoiou nossa mudança de padrão de apartamento, passamos a andar com carros mais antigos e as viagens ficaram mais espaçadas – imagina viver isso partindo de uma decisão monocrática? Não daria certo, pelo menos não para mim.




Outra vantagem que um ex-executivo traz para a vida empreendedora é a capacidade de trabalhar e valorizar os bons sócios. Embora a vida de um diretor de uma corporação seja relativamente solitária, eles não fazem ideia do que é empreender sozinho. A escolha dos sócios corretos é fundamental para o sucesso do negócio. Eu tenho orgulho de dizer que temos sócios incríveis, todos contribuem demais para o sucesso do negócio, sejam os fundadores ou investidores. Até mesmo aqueles que deixaram a sociedade no caminho foram fundamentais nesse processo.

Por fim, gostaria de deixar outro grande aprendizado, agora obtido já como empreendedor. Talvez o incentivo emocional que você mais escutará durante sua empreitada empreendedora será a de nunca desanimar nos momentos difíceis – “levanta a cabeça, não desista e siga em frente.” Isso é totalmente verdade. No entanto, acho que essa recomendação está incompleta. Durante a sua jornada, haverá momentos negativos e momentos positivos, eufóricos. Aqui, precisa-se tomar muito cuidado para não perder a cabeça e fazer bobagens – aliás, estamos muito mais propensos a fazer coisas erradas quando estamos otimistas e confiantes do que quando receosos. O segredo é manter o equilíbrio e saber que o jogo não está ganho após uma boa reunião com cliente, promessa de contrato milionário ou demonstração de interesse de um fundo em investir na sua empresa.

Bons negócios e sucesso!

CEO e Fundador da Accountfy, Bacharel em Economia pela UFF – Universidade Federal Fluminense, Pós-Graduação em Finanças -INSPER

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