MUITAS VAGAS – Poucos Candidatos Qualificados, Será?
“Será?” é uma, digamos, provocação (no bom sentido) da qual o conhecidíssimo professor e filósofo Mário Cortella se utiliza em algumas das muitas palestras que ministra para fazer com que as pessoas reflitam sobre frases, crenças ou posturas estabelecidas e consideradas corretas.
No artigo que ora apresento-lhe, caro leitor, peço autorização ao mencionado filósofo para apropriar-me por uns momentos da mesma expressão por conta de uma publicação que há algumas semanas vi no LinkedIn.
Esse post, feito por um alto executivo de uma Corporação (um CEO) demonstra a preocupação, que não pretendo de modo algum deixar de considerar legítima, de uma quantidade expressiva de líderes corporativos com relação à questão da lacuna existente entre a significativa disponibilidade de vagas e oportunidades de colocação profissional versus a baixa quantidade de profissionais preparados para enfrentarem as novas tecnologias, as mudanças nas relações do trabalho e a irrefreável automação e/ou digitalização de processos e atividades em todos os campos de atuação.
No trecho que observei o CEO diz que “Sobram vagas, faltam profissionais habilitados. Esse é um cenário crescente dentro das empresas no Brasil e no mundo. Segundo uma pesquisa da consultoria e auditoria PwC, a falta de disponibilidade de profissionais com as habilidades demandadas pelas companhias é uma preocupação de 79% dos CEOs no mundo todo. A situação se agrava enquanto as companhias tentam se atualizar para o mundo digital.”
Ainda com relação a esta questão, há uma observação da Consultoria PwC mostrando que “…as organizações e os principais executivos têm se preocupado com inovação e transformação digital, o que envolve uma mudança de cultura. Mas quanto mais vão atrás disso, mais percebem um entrave”, afirma um dos sócios da PWC Brasil. “Existe um número limitado de profissionais no mercado treinados, preparados e capacitados para isso”.
É importante deixar bem claro que não pretendo de forma alguma defender ou atacar este ou aquele post, ideia, preocupação, direcionamento, enfim o que for, mas sim buscar fazer com que tomemos consciência do quão importante será, nosso firme propósito em encontrarmos uma solução para o dilema mostrado, ou seja, oportunidades sobrando e pessoas faltando por descasamento de competências versus necessidades uma vez que simplesmente tornar-se-á inviável a recusa em nos adequarmos às inovações que já fazem parte de nosso dia-a-dia.
É importante lembrar que também não tenho a pretensão de neste espaço apontar um solução, o que seria uma temeridade e uma total ausência de bom senso de minha parte, ou seja, em nossa coloquial linguagem eu estaria sendo no mínimo “sem noção”. Desejo provocar em mim, em você, nas pessoas envolvidas neste assunto, enfim em todos nós a reflexão conjunta sobre um ponto que ao “final do dia”, arriscar-me-ia a dizer, é a questão essencial da Teoria Econômica, ou seja, temos necessidades críticas (as vagas para atuação nas novas Corporações), PORÉM, os recursos para atendimento dessas necessidades são escassos (poucos profissionais preparados). Neste ponto a Economia (um ente abstrato) entra em colapso, pois não consegue se movimentar para a frente.
É a pura essência da Teoria Econômica Clássica.
Quando menciono “…nosso firme propósito…” incluo nesse grupo os CEOs e os profissionais de Consultoria que lhes apontam onde está o gargalo das Instituições que comandam. A “nova” Consultoria também precisa neste momento de transição mostrar um caminho, mas caminhos alternativos que mitiguem o gap encontrado.
Para que a visualização de novos caminhos aconteça será necessário que a Nova Consultoria coloque-se também em posição de escuta no ambiente em que está realizando seu trabalho. Da escuta ativa, surgirão com certeza oportunidades de correção desse lack de pessoas consideradas preparadas para auxiliar as Corporações a superarem a fase complicada de transição para o novo patamar de produção e emprego.
Se o mundo corporativo restringir-se às constatações de que não existem pessoas adequadas para exercerem os novos papéis ou as novas profissões, chegaremos a um momento de inviabilização dos Businesses, pois o surgimento de inovações e demandas será cada vez maior e mais veloz. Isto seria caótico, pois ninguém mais seria capaz de fazer coisa alguma das novas que surgem, justamente pelo motivo citado, ou seja a velocidade em que inovações suceder-se-ão levando-nos a uma situação na qual nunca haverá pessoas totalmente preparadas para exercerem os novos papéis! Complicado não é? Mas absurdo!
Mas então o que fazer? Como enfrentar essa questão de que as Organizações estão desguarnecidas de pessoas habilitadas, o que preocupa tanto os CEOs?
Neste ponto entra a expressão “Será?”
O “será” é indagação para a afirmação sobre o “problema” “sobram vagas porém faltam pessoas com a qualificação necessária para ocupá-las”. Será mesmo que FALTAM pessoas qualificadas? Minha opinião sincera é que NÃO. O que falta é ousadia das Instituições em colocar seus colaboradores para aprenderem o que é necessário, de forma gradual, para as devidas adaptações. E neste ponto será possível perceber quem de fato está preparado para enfrentar a nova Revolução Industrial. Quem não aceitar aprender, sentimos muito, mas precisará repensar seu caminho. Nada é impossível de realização, mesmo com tanta e tão rápida informação e canais abertos.
As pessoas que não se sentirem confortáveis em aprender a trabalhar corporativamente da forma como as inovações exigirão (na verdade já estão exigindo), poderão com certeza, com o advento de novas necessidades, encontrar novos caminhos, pois situações e profissões novas pedirão novos serviços (e estamos vendo uma invasão de startups com cada coisa…), encontrar alternativas de oferecerem serviços que em tempos passados não se faziam necessários.
Outro “será?”: será mesmo que o gap entre vagas e habilitados é um “problema”? Também entendo que NÃO!
Explicando: vamos para uma outra constatação derivada desse entrave de descasamento de competências. Pensando bem não denominarei como um “entrave” mas uma fonte de oportunidades que, se bem aproveitadas, podem levar a uma mitigação do potencial desemprego das pessoas que em tese acabam perdendo seus postos de trabalho pela eliminação das tarefas que executam, o que acaba sendo um movimento natural desse novo ciclo.
Vamos à constatação:
Ouvimos notícias muito boas de um movimento positivo na Economia Brasileira, que no período final de 2019 deu claros indícios de começo de recuperação por conta do resultado (bom) inesperado do PIB. Também ouvimos que o resultado das montadoras foi MUITO bom, com o aumento da produção e das vendas, de uma forma que também surpreendeu a todos. Ao se analisar mais de perto o ótimo resultado da indústria automobilística que vinha amargando desempenhos pífios que chegaram a planos de encerramento de atividades ou redução de plantas, percebeu-se que uma parte importante dessa elevação da produção e comercialização, originou-se de empresas que compraram frotas de veículos para locação a motoristas de aplicativos.
O que isso nos mostra? Que existe uma demanda não atendida (uma necessidade de agentes econômicos) por parte das pessoas que estão ocupadas em transportar outras pessoas. Se houve um incremento dessa demanda, pode ter acontecido algo como:
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Os atuais condutores de aplicativos compreenderam a necessidade dos passageiros por serviços mais elaborados (você como passageiro não se gostaria de viajar em um carro mais confortável e moderno?). Dado que eventualmente não possam ainda adquirir seu veículo próprio, procuram locadoras que hoje os alugam a profissionais de aplicativos que desta forma apresentam-se mais adequadamente a seus clientes, aumentando suas chances de fazerem bons lucros possibilitando num momento posterior a aquisição de seu próprio veículo. Veem como novas necessidades fazem aparecer novos serviços? Por acaso no passado existiam locadoras de veículos para aplicativos? Que nada, nem aplicativos existiam!
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Com as eliminações de postos de trabalho que não mais tem funcionalidade com o advento dos novos processos, muitos dos que perderam seu lugar viram-se na contingência de atuar como motoristas de aplicativos. Sem muitos recursos, acabam fazendo uso de carros alugados. Com o aumento do número de pessoas trabalhando por aplicativos, as locadoras perceberam um ótimo nicho e passaram a demandar mais das montadoras, realimentando de forma positiva a cadeia produtiva, uma vez que a indústria demandada necessitará também de peças, acessórios, estofados para bancos, espelhos, películas, rodas, pneus, parafusos, porcas, grades, tapetes, etc, etc, etc. Assim começarão a surgir novos fornecedores (quem sabe até os antigos funcionários que perderam seus postos), novas demandas, novas ofertas de emprego em pequenas e médias empresas e por aí vai.
Qual é o resultado? Cada vez mais pessoas empregadas em serviços necessários à produção industrial, gera a movimentação ainda que gradual da Economia, consumo, passa a demandar melhora no crédito ao pequeno empreendedor, fazendo com que os agentes econômicos demandem cada vez mais do mercado. Isto provoca a recuperação, de uma forma bem simplificada.
E como aconteceu isso? Do desemprego das pessoas que trabalhavam lá nas Organizações que estavam com um “problema” de não ter casamento entre as novas tecnologias e as vagas existentes, de não poder mais contar com antigos colaboradores porque suas funções perderam espaço, ou seja, a Economia acaba se ajustando!
Lembram-se do tempo em que ainda não existiam os celulares? Ninguém vendia acessórios, badulaques, capinhas, estojinhos, carteirinhas, com cristais, sem cristais, com orelhinhas, com caretinhas, enfim uma porção de apêndices para acondicionar seu celular. E esse tipo de oferta viralizou, não é mesmo? Então pensemos nas necessidades que advirão de novas profissões, novas tecnologias, novas relações! É muita oportunidade!
Quem pensava em planos de saúde para pets? Quem, dos mais velhos, usou os mais diversos looks em seu pet? Como foi que essas coisas nasceram?
Partamos do seguinte princípio defendido pela empresária Luiza Helena Trajano da empresa Magazine Luiza. Luiza defende que os objetivos a que nos propomos não são pontos de chegada e sim sempre pontos de partida para uma nova fase, de forma que JAMAIS podemos nos acomodar quando atingimos determinada meta. O conhecimento nunca deve ser “terminado”, é necessário que se renove sempre!
Posto isto, creio que possamos inferir algumas conclusões:
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Se todo objetivo é um ponto de partida para mais uma etapa de crescimento e aprimoramento em qualquer nível, então na verdade dificilmente alguém estará em uma posição de preparo total, o que nos leva a crer que sempre temos que aprender mais e mais. Cada vez que temos uma inovação chegando e nos preparamos para entendê-la a fim de tirar o melhor proveito do que ela nos traz, com certeza em pouco tempo já nos depararemos com a necessidade de conhecer a nova versão. Isso fica muito claro com os modelos de computadores, celulares, robôs, máquinas industriais, etc. Quando você finalmente chegou ao ponto de ensinar sobre um dado assunto, quase que na sequência precisa recomeçar sua pesquisa.
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O conhecimento hoje evolui muito rapidamente, por este motivo temos os diversos pontos de chegada transformando-se em novas partidas com muita rapidez. Hoje fica complicado parar muito para analisar, embora eu não deixe de concordar que um momento de feedback e auto avaliação devam existir, porém deverão ser objetivos e bem específicos. De novo aqui enfatizo que pela velocidade com que as informações se disseminam, para qualquer pessoa mesmo aquela com uma mente muito aberta e bem formada é quase impossível incorporar todo o novo conhecimento. Essa habilidade será obtida ao longo da prática, do convívio com casos e experiências.
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Nunca ninguém estará totalmente pronto para coisa alguma, por mais informado e conectado que esteja. A pessoa preparada é aquela que estudou, aprimorou-se sempre, claro, E que está aberta totalmente a enfrentar os novos desafios e IMPORTANTE, aprender com eles, fazendo com que cada obstáculo seja um elo para a continuidade de um processo de constante desenvolvimento de habilidades, aptidões e técnica.
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Se cada meta é um ponto de partida, a pessoa que tem um perfil outstanding com certeza evitará a armadilha de ficar paralisado na análise do melhor caminho a seguir. Ao invés disso essa pessoa sim poderá até avaliar o que seria o melhor caminho, porém não permitirá que o conforto de ficar só analisando a melhor alternativa a seguir prejudique seu avanço.
Assim, de uma frase curta e assertiva da empresaria Luiza Trajano pudemos derivar algumas reflexões importantes, tirando daí uma lição para todos nós.
Não quero em hipótese alguma simplificar tanto a questão. É óbvio que em se tratando de uma Corporação complexa, com um amplo espectro de ação, é muito desafiador, complexo, custoso e até um pouco demorado para a empresa ter que se ajustar aos novos tempos e exigências da maneira como o mercado exige, ou seja, com rapidez e correção. Se seus processos, linhas de produção, equipamentos, políticas internas, logística, estratégia, e tantos outros fatores que envolvem a produção de bens e serviços precisam ser totalmente revisitados, é natural que tudo que esteja ligado a esses itens será muito impactado. Por este motivo, as Instituições buscam com avidez pessoas que tenham conhecimento e vivência em novas técnicas e que além de tudo tenham o espírito empreendedor para aplicar seu conhecimento e incorporar mais pela vivência diária de uma forma quase imediata.
Mas é justamente aí que mora o problema e que a tal lacuna precisa ser eliminada de forma mais eficiente para a empresa e inclusive para quem busca uma colocação, porque não há como simplesmente se deixar ao Deus dará o contingente pessoal que não mais possui as características do novo negócio, como se fossem sacos de inutilidades.
Não desejo ser simplista, nem diminuir o tamanho da preocupação dos líderes de Corporações, mas acredito que possa haver algum aproveitamento, simplesmente porque esses colaboradores conhecem a fundo a Organização e podem trabalhar na remontagem de forma eficiente.
Imaginemos que não existe a lacuna se a empresa ousar investir de forma inteligente. Ela já possui um ativo importantíssimo que são essas pessoas que hoje estão exercendo suas funções. Será que não seria possível um plano de readequação e treinamento para ao menos as pessoas consideradas chave?
Será que isso não pode ser levado em conta? A empresa sempre necessitará oxigenar-se, mas se não encontrar no mercado profissionais já preparados, por que não abrir caminhos novos para quem já está, trazendo também novas cabeças que com certeza terão o conhecimento, PORÉM não tem o background da essência de operar da Organização! Parece pouca coisa, mas não é!!
Afinal, alto executivo, quando você iniciou sua carreira bem sucedida já chegou em seu primeiro ambiente de trabalho dominando tudo?? Evidente que não, pois não conhecia nada de sua nova casa! Então, mesmo quem já vem com todo o arsenal de técnicas e conhecimentos da nova indústria sentir-se-á “perdido” feito cego em tiroteio em uma Corporação, sentindo a necessidade de um período de adaptação, ou seja é impossível a uma pessoa chegar 100% preparada!
O que a empresa necessita em termos de recursos? O que, posto essas necessidades será necessário desaprender para o novo aprendizado? Quem, entre os que já estão pode se reciclar a fim de manter a continuidade em um patamar de novidades?
Que tipo de planejamento os estrategistas das Corporações, juntamente com os Diretores de RH podem criar em termos da condução do seu Business para um período X, levando em conta que possuem um ativo tão crítico para sua Organização que são exatamente as pessoas que lhe dão vida e que (desculpem, podem achar pieguice) lhe deram a vida?
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Maria da Penha Amador Pereira, Economista formada pela Pontificia Universidade Católica de São Paulo com especialização em Desenvolvimento Econômico.
Atuou em carreira corporativa na antiga Companhia Energética de São Paulo, Banco do Estado de São Paulo e no Citibank, onde desenvolveu carreira por aproximadamente 30 anos em Controladoria, Planejamento Estratégico, Segurança de Informações, Gestão de Crises e Continuidade de Negócios, Qualidade, Projetos de Melhorias de Processos e Produtos Bancários, Controles Internos, Auditoria, Governança Corporativa, Regulamentação Bancária e Compliance.
Atualmente é escritora com obras já publicadas, Master Coach e PNL, Orientadora e Mentora de Carreiras, Palestrante e Educadora Financeira, tendo publicado mais de 55 artigos em Portais de Empreendedorismo, mídias sociais, jornais e revistas regionais e LinkedIn, além de ter participado de vários seminários e fóruns sobre diversos temas ligados à realidade brasileira e Compliance.
Todas estas questões, devidamente ponderadas, levantam dúvidas sobre se a valorização de fatores subjetivos possibilita uma melhor visão global do impacto na agilidade decisória.